terça-feira, 19 de junho de 2012

"Espadas de fogo" de Cruz das Almas inspiram artista visual Zé de Rocha

Não estranha que, ao repassar sua própria obra, Zé de Rocha tenha recorrido à palavra “risco”. Autor de trabalhos ocupados pelo violento e o urbano (como os carros destruídos que gravou com carvão), tudo está compreendido pelo vocábulo que designa o traço de seu desenho, mas também o ônus das situações. “Me interesso pelo choque visual e o objetivo era encontrar uma expressão-panorama”, diz, referindo-se ao exercício proposto pelo curso de mestrado em artes visuais da Ufba e que originou os primeiros trabalhos da série Sangue-Ígneo, expostos desta terça-feira (19) até 28 de julho, na galeria RV.
A revisão do material produzido lhe autorizou também um olhar para o quintal de casa, no caso a terra natal Cruz das Almas (a 146 km de Salvador). Dela, Zé extraiu as "espadas de fogo" como instrumento para a pintura – em Correndo Risco, como foi batizada a exposição, é a pólvora que toca a tela. Questão cultural - Em pé, munido de luvas, capacete e bota, ele repetiu sempre o mesmo ritual, lançando a espada em direção à lona, dominando o tempo da combustão. Uma ação que o aproximou dos homens que guerreiam na noite de São João em Cruz das Almas. "Tinha muito de performance. Era como dançar com fogo", lembra.
Se toda arte é política, a de Zé agora fala claro sobre a proibição da guerra de espadas, reivindicada pelo Ministério Público e aprovada em 2011 pelo Tribunal de Justiça da Bahia.
"Os programas policiais trouxeram um grande dano à imagem dessa manifestação. Mas essa é uma questão cultural, que precisa ser encarada como expressão popular. A guerra remonta a costumes comuns também na Espanha e em Portugal, ou seja, faz parte das muitas influências culturais brasileiras”, diz Zé.
Referência chinesa - Estampando em sua própria camisa a opinião sobre o tema – “cultura popular não é crime” –, o artista recorre à força com que sobrevivem as tradições do homem para justificar o pensamento. "O que o povo criou só o povo pode destruir".
O trabalho com fogo e o resgate do popular aproximam seus novos trabalhos dos desenvolvidos pelo artista visual chinês Cai Guo-Qiang, uma referência citada pelo próprio Zé e cuja matéria prima é, na maioria dos casos, a pólvora, inventada na China, e também o bambu, papel e outros elementos de sua cultura natal.
“Essa nova série de trabalhos tem força e sinceridade, sobretudo nesse olhar local”, diz Ilan Iglesias, um dos sócios da galeria RV, espaço que representa Zé há pouco mais de um ano.
Serigrafia - Mas se olha para o umbigo, ele também marca suas telas com a imprecisão do território. Em grande parte pelo uso da serigrafia, técnica recorrente em sua trajetória e que chama a tradição da pop art.
Sobrepostos ao traçado das espadas, os desenhos serigrafados (pernas que vestem jeans, cilindros que lembram tanques, um torso coberto com jaqueta) carregam a realidade das diferentes circunstâncias.
Está o sujeito da imagem a soltar um rojão ou a enfrentar como pode as intempéries da vida?
“Às vezes me pego surpreso olhando um desenho que fiz e que parece ser sobre a revolução no Egito, sobre a Primavera Árabe”, conta Zé.  “Gosto de pensar que aquilo que está no quadro pode dizer sobre algo que ainda não vivi”. (ATarde)

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